Os governadores Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, e Rafael Fonteles (PT), do Piauí, enfrentaram-se na segunda edição da série Diálogos, na quinta-feira, para tratar dos impactos do tarifaço anunciado pelo presidente norte-americano Donald Trump. O encontro evidenciou pontos de convergência sobre os prejuízos econômicos, mas escancarou divergências quanto à condução do governo federal e à atuação do Supremo Tribunal Federal (STF).
Choque político: Lula, STF e Brics no centro do debate
Pré-candidato à Presidência em 2026, Zema não poupou críticas. Ele alertou para “excessos” do ministro Alexandre de Moraes, classificando-o como “réu, juiz e acusador ao mesmo tempo”, o que, em sua avaliação, corrói a credibilidade do Judiciário. O mineiro argumentou que as sanções impostas pelos EUA a Moraes são consequência direta dessa postura.
No plano externo, Zema questionou a permanência do Brasil no Brics. Para ele, o bloco reúne países com modelos políticos díspares e pouca afinidade com valores democráticos caros ao Brasil. “Trata-se de um Frankenstein sem objetivos comuns”, resumiu.
Fonteles, aliado do Planalto, optou por defender a diplomacia petista. Segundo o piauiense, o Palácio do Planalto manteve diálogo com Washington “sem subserviência” e já obteve redução de tarifas em 700 itens, além de prorrogação do início da sobretaxa por sete dias. Ele rejeitou a mistura de temas jurídicos com comércio exterior, chamando a conduta americana de “desrespeitosa”.
Tarifaço atinge exportações e mobiliza governos estaduais
Ambos concordaram sobre o risco econômico. Minas Gerais, maior exportador nacional de café, segue com taxa de 50% sobre o produto. Zema relatou a liberação de R$ 200 milhões em crédito subsidiado e antecipação de mais de R$ 100 milhões em créditos de ICMS a fim de socorrer empresas locais.
No Piauí, a dependência do mercado norte-americano não chega a 5% da pauta exportadora, concentrada na China (65%). Ainda assim, Fonteles manifestou preocupação regional por presidir o Consórcio Nordeste e anunciou reunião com o presidente Lula e o vice Geraldo Alckmin para discutir alternativas.
Sistema partidário, reeleição e voto distrital na mira
A redução do número de legendas apareceu como ponto de consenso. Fonteles defendeu fusões ou federações para enxugar o quadro, alinhado a projeto que unifica todas as eleições e extingue a reeleição. Zema aderiu à ideia, mas acrescentou a adoção do voto distrital misto, visando aproximar representantes da base eleitoral e simplificar a governabilidade.
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Imagem: Júlia Aguiar via oglobo.globo.com
Responsabilidade fiscal e futuro da Previdência
O mineiro voltou a criticar o “inchaço” federal ao afirmar que a economia “vem sendo anabolizada” por gasto público. Fonteles rebateu, afirmando que equilíbrio fiscal é pré-requisito para qualquer política, citando o Piauí como exemplo de estado sem dívida com a União.
Na previdência, ambos enxergam necessidade de nova reforma. Fonteles destacou o envelhecimento populacional e a prática internacional de ajustes periódicos. Zema sugeriu gatilhos automáticos: aumento de contribuição sempre que a expectativa de vida subir, evitando discussões recorrentes no Congresso.
Perspectivas e próximos passos
Enquanto a Casa Branca revisa parte das tarifas, os governadores monitoram efeitos locais. Zema aposta em medidas emergenciais para proteger exportadores mineiros, sobretudo do café. Fonteles busca ampliar mercados alternativos, como já fez com o mel piauiense, ao mesmo tempo em que pressiona Brasília por negociação direta.
Além dos impactos imediatos sobre comércio exterior, o debate reforçou temas estruturais: reforma política, ajuste previdenciário e responsabilidade fiscal. As posições antagônicas quanto ao STF, ao Brics e à política externa evidenciam a distância entre a visão liberal de Zema e a estratégia intervencionista defendida pelo PT.
A série Diálogos prossegue com novos encontros entre gestores estaduais e municipais, mantendo foco em temas que influenciam a agenda nacional. Até lá, o tarifaço de Trump segue como teste para a diplomacia brasileira e para a capacidade dos estados de proteger seus setores produtivos.
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