Um novo capítulo da disputa comercial entre Brasília e Washington ganhou repercussão internacional depois que a Embaixada da França no Brasil publicou, nos dias 13 e 14 de agosto, um vídeo irônico em apoio ao país. A manifestação veio na esteira do tarifaço de 50% anunciado pelo presidente Donald Trump contra uma extensa lista de produtos brasileiros vendidos aos Estados Unidos.
França usa redes sociais para sinalizar parceria
A peça publicada pelo corpo diplomático francês foi montada com a música “Amor Traumatizado”, de Carol Biazin e Felipe Amorim, e incluiu imagens de encontros recentes entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Emmanuel Macron. O conteúdo destaca acordos firmados entre os dois governos, como projetos de cooperação em defesa, ciência e meio ambiente.
Na legenda, a embaixada frisou que “França e Brasil compartilham valores, projetos e sonhos”, acrescentando a provocação: “Tem gente que não tem parceria forte com o Brasil… que pena que não é o meu caso!”. A publicação gerou milhares de interações em poucas horas e foi interpretada como resposta direta às tarifas impostas por Washington, além de um gesto de aproximação política entre Paris e Brasília.
Até então, manifestações públicas de solidariedade ao governo brasileiro contra sanções econômicas dos Estados Unidos eram raras. A reação francesa seguiu o posicionamento da Embaixada da China, que já havia elogiado o café nacional e ressaltado sua crescente participação nos setores de entregas rápidas e bebidas dentro do Brasil.
Tensão Brasil–EUA cresce após aumento de tarifas
O clima bilateral se deteriorou no último dia 6, quando o presidente Trump determinou a elevação em 50% das alíquotas de importação aplicadas a uma gama variada de mercadorias brasileiras. Em comunicado enviado ao Itamaraty, a Casa Branca justificou a medida como necessária para “corrigir graves injustiças do sistema comercial”. O documento também citou a perseguição política ao ex-presidente Jair Bolsonaro e as restrições à liberdade de expressão no Brasil como fatores que tornaram a reação norte-americana indispensável.
Além das tarifas, Washington anunciou a revogação de vistos de servidores ligados ao programa Mais Médicos, sob alegação de envolvimento em irregularidades com profissionais cubanos. Outra medida atingiu diretamente o Judiciário: o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, teve a entrada nos Estados Unidos proibida. A decisão foi encarada por analistas como sinal claro de descontentamento norte-americano com decisões consideradas lesivas a princípios de liberdade de imprensa e expressão.
A Embaixada dos EUA em Brasília contribuiu para o aumento da temperatura diplomática ao publicar críticas ao governo Lula em suas redes sociais logo após o anúncio do tarifaço. O Planalto reagiu classificando as medidas como “ataque à soberania nacional”, mas evitou falar em retaliação direta. O presidente afirmou que seguirá “buscando diálogo” enquanto prepara um plano de compensação aos exportadores.
Consequências para a economia brasileira
Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, os produtos afetados respondem por cerca de US$ 9,4 bilhões da corrente de exportação anual brasileira para o mercado norte-americano. Itens como aço, alumínio, calçados e suco de laranja estão entre os mais sensíveis. Federações industriais alertam para risco de perda de até 40 mil postos de trabalho caso as tarifas se mantenham por um período prolongado.
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Técnicos do governo reconhecem que a margem de manobra é limitada. O Brasil poderia recorrer à Organização Mundial do Comércio, mas o processo é demorado. Outra alternativa seria buscar acordos bilaterais em setores específicos, estratégia que depende da disposição de Washington em negociar.
Solidariedade internacional e cálculo político
O gesto francês, embora simbólico, reforça a tentativa do Palácio do Planalto de construir uma frente de apoio externo contra o protecionismo americano. Paris tem interesse direto em projetos de infraestrutura no Brasil, inclusive na área de defesa, onde empresas do país europeu disputam contratos bilionários. Já Pequim, principal parceiro comercial de Brasília, quer preservar o fluxo de commodities brasileiras diante de possíveis redirecionamentos de oferta.
Nos bastidores, diplomatas avaliam que a convergência de França e China com o Brasil serve de contraponto à postura de Washington. A intensa circulação do vídeo francês nas redes sociais, no entanto, também alimenta críticas internas sobre a condução da política externa. Parlamentares de oposição classificam a dependência de apoios pontuais como indício de enfraquecimento da inserção global brasileira desde o início da atual administração.
Enquanto isso, exportadores pressionam por respostas rápidas. Representantes do setor de siderurgia pedem redução temporária de tributos federais e criação de linhas de crédito emergenciais. A Confederação Nacional da Indústria calcula que a recomposição de mercados alternativos pode levar até dois anos.
Até o momento, não há previsão de diálogo presencial entre Lula e Trump. O Departamento de Estado informou apenas que “mantém canais abertos com o Itamaraty”. Analistas, porém, lembram que o início do período eleitoral nos EUA tende a tornar qualquer recuo tarifário politicamente custoso para a Casa Branca.
Nesse cenário, a exibição de apoio público por parte da França adiciona uma nova peça ao xadrez diplomático. Resta saber se a pressão conjunta de parceiros europeus e asiáticos será suficiente para reverter ou amenizar o tarifaço que atinge em cheio setores estratégicos da economia brasileira.
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